
Metanol em bebidas: o que está acontecendo no Brasil e quais os riscos à saúde
Nos últimos meses, o Brasil vem enfrentando uma situação preocupante. Casos de pessoas intoxicadas por bebidas com metanol começaram a aparecer em vários estados, e isso acendeu um grande sinal de alerta nas autoridades de saúde. O Ministério da Saúde chegou a montar uma Sala de Situação Nacional para acompanhar os casos e tentar impedir que a situação piore.
Até agora, foram mais de 40 casos suspeitos de intoxicação registrados no país. A maioria aconteceu em São Paulo, onde pelo menos 10 já foram confirmados. Em Pernambuco, outros quatro casos estão sendo investigados. Houve mortes confirmadas, e várias outras estão sendo analisadas.
Em São Paulo, dois casos chamaram muita atenção: um homem de 54 anos, morador da zona leste da capital, e outro de 38, em São Bernardo do Campo, morreram depois de consumir bebidas adulteradas. Em apenas dois dias de operação, a polícia apreendeu mais de 800 garrafas suspeitas em bares e depósitos. O mais assustador é que muitas dessas garrafas estavam lacradas e pareciam originais, o que mostra o quanto esse tipo de crime é perigoso e difícil de detectar.
Por conta disso, muita gente passou a ter medo de consumir destilados como cachaça, vodka e uísque em bares ou festas. Bares e restaurantes começaram a restringir o uso dessas bebidas, e a vigilância sanitária intensificou as fiscalizações.
O que antes era um problema isolado, agora virou um caso de saúde pública.
O que é o metanol e por que ele é tão perigoso
O metanol é um tipo de álcool, mas não é o mesmo álcool que existe nas bebidas que a gente consome. O álcool comum das bebidas é o etanol — o mesmo usado em combustíveis, mas em grau próprio para consumo humano.
O metanol, por outro lado, é um álcool industrial, usado na fabricação de combustíveis, tintas, solventes e outros produtos químicos. Ele não pode ser ingerido em hipótese alguma.
O problema é que o metanol é muito parecido com o etanol. É um líquido transparente, com cheiro e gosto semelhantes, o que facilita a adulteração de bebidas. Golpistas ou falsificadores o usam porque é mais barato, e muita gente não consegue perceber a diferença. Só que dentro do corpo, ele age de forma completamente diferente — e muito mais perigosa.
Como o metanol age no corpo
Quando uma pessoa bebe algo que contém metanol, o corpo tenta metabolizar (ou seja, quebrar) a substância do mesmo jeito que faz com o álcool comum.
Mas o resultado é devastador: o metanol se transforma em formaldeído e ácido fórmico, dois compostos extremamente tóxicos.
Essas substâncias atacam as células e atrapalham o funcionamento normal do corpo. Um dos órgãos mais afetados é o olho. É por isso que a cegueira é um dos sintomas mais conhecidos de intoxicação por metanol.
O ácido fórmico também provoca problemas neurológicos, dificuldade para respirar e queda brusca de pressão. Em casos graves, leva ao coma e à morte.
O mais traiçoeiro é que os sintomas não aparecem de imediato. Nas primeiras horas, a pessoa pode sentir apenas uma leve tontura, enjoo, dor de cabeça ou visão embaçada — o que se confunde facilmente com uma “ressaca comum”.
Depois de 10 a 12 horas, quando o metanol já foi transformado dentro do corpo, é que os sintomas se tornam graves: a visão piora, a pessoa sente dor no estômago, vomita, tem falta de ar, confusão mental e pode perder a consciência.
Se não houver atendimento rápido, o quadro evolui muito rápido para algo fatal.
Quanto metanol basta para causar dano
Não é preciso muito para o metanol fazer estrago.
Cerca de 10 mililitros (duas colheres de chá) já podem causar cegueira permanente.
Com 30 mililitros (pouco mais de uma dose de pinga), há risco real de morte.
Em bebidas adulteradas, o metanol costuma estar misturado ao etanol, o que faz com que a pessoa não perceba o perigo. Isso torna os casos ainda mais graves, porque a vítima só percebe quando já é tarde demais.
Por isso, os médicos reforçam: nunca consuma bebidas de origem duvidosa.
Mesmo que a garrafa pareça lacrada, é importante comprar apenas de locais confiáveis. As falsificações estão cada vez mais bem feitas, e o risco não vale a pena.
Por que o metanol continua aparecendo em bebidas
A resposta é simples: lucro fácil.
O metanol é mais barato que o etanol usado em bebidas. Então, falsificadores o misturam para economizar e aumentar o volume de produção.
O problema é que, ao fazer isso, eles estão literalmente colocando veneno dentro das garrafas.
Esse tipo de adulteração já aconteceu várias vezes na história — no Brasil e em outros países. Em 2022, por exemplo, mais de 30 pessoas morreram no Equador após consumir bebidas adulteradas com metanol. Na Índia, casos assim são frequentes, e o país já registrou centenas de mortes em um único surto.
Agora, o Brasil volta a viver um episódio semelhante, mostrando que o problema é recorrente e difícil de erradicar.
O que agrava a situação é que, muitas vezes, essas bebidas são vendidas em festas populares, em bairros afastados, ou até distribuídas por ambulantes em garrafas “artesanais”.
O consumidor, sem saber, confia na aparência da garrafa, no cheiro da bebida, e acaba se expondo a um risco enorme.
O corpo luta, mas o veneno vence
Quando o metanol entra na corrente sanguínea, ele começa a afetar o sistema nervoso central, o fígado e os rins.
O fígado tenta transformar a substância em algo que possa ser eliminado, mas nesse processo o veneno se multiplica. O ácido fórmico se acumula e o sangue se torna mais ácido — o que pode causar parada respiratória e falência múltipla dos órgãos.
O tratamento ideal precisa acontecer rápido.
O paciente deve receber um antídoto (como etanol médico ou fomepizol), que bloqueia a ação da enzima que transforma o metanol em ácido fórmico.
Mas o problema é que quase ninguém sabe que ingeriu metanol, até que os sintomas graves apareçam. Quando a pessoa chega ao hospital, muitas vezes já há danos irreversíveis.
Um inimigo invisível
O que mais assusta nesse tipo de intoxicação é o fato de que o metanol não avisa. Ele não tem um gosto estranho, não muda o cheiro da bebida e não causa reação imediata.
Você pode beber e achar que está tudo bem — até que, horas depois, o corpo comece a falhar.
Por isso, campanhas de conscientização são fundamentais.
O Ministério da Saúde, junto com as vigilâncias estaduais, vem tentando reforçar os alertas, investigar fábricas clandestinas e garantir que os estoques de antídotos estejam disponíveis nos hospitais do SUS.
Ainda assim, o desafio é enorme: o Brasil é um país de dimensões continentais, e a fiscalização não consegue estar em todos os lugares.
O que fazer diante de uma suspeita
Se você ou alguém próximo tomou uma bebida suspeita e começou a sentir sintomas como visão embaçada, tontura, dor de cabeça forte, enjoo ou confusão mental, procure um hospital imediatamente.
Não espere os sintomas piorarem — cada hora faz diferença.
Leve, se possível, a garrafa ou a embalagem da bebida para ajudar os médicos a identificar a causa.
E nunca tente “curar em casa” com remédios, café, leite ou qualquer outra coisa. Nenhum desses métodos ajuda — e podem até atrapalhar o tratamento.
Por fim, só consuma bebidas de origem confiável, com nota fiscal e procedência garantida. Mesmo uma garrafa aparentemente original pode esconder um risco sério.
Quando o assunto é metanol, o melhor remédio é a prevenção e a desconfiança saudável.